Saúde

Em 20 anos, quase metade dos brasileiros serão obesos, diz pesquisa

Se as tendências atuais forem mantidas, 48% dos adultos brasileiros terão obesidade e 27% terão sobrepeso até 2044. É o que prevê um estudo nacional realizado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) de Brasília. O levantamento estima, ainda, que daqui a 20 anos três quartos dos adultos brasileiros terão obesidade ou sobrepeso, 83 milhões e 47 milhões, respectivamente. Além de efeitos à saúde, as condições de peso também impactam a economia brasileira, com sobrecarga nos serviços do Sistema Único de Saúde (SUS) e saúde suplementar.

O pesquisador do Programa de Alimentação, Nutrição e Cultura (Palin) da Fiocruz Brasília, Eduardo Nilson, responsável pelo levantamento, aponta as estimativas anuais de gastos pelo SUS ligados à obesidade, já que a doença está associada a outras comorbidades, como hipertensão, doenças cardiovasculares, diabetes, doenças renais e do sistema digestivo, neurológicas e câncer.

“Só para dar uma ideia, nós temos estimativas de que 1,5 bilhão de reais são gastos por ano no SUS com doenças atribuídas à obesidade, então, é uma carga econômica muito grande”, diz Eduardo Nilson. 

De acordo com a Fiocruz Brasília, hoje, 56% dos adultos brasileiros têm obesidade (34%) ou sobrepeso (22%). E, ao longo dos anos, a prevalência da condição tem aumentando de forma rápida e, inclusive, quase dobrou de 2006 para 2019 – com 20,3% da população adulta atingida. 

A estimativa é de que até 2030 a incidência totalize 68,1% para sobrepeso e obesidade combinados, sendo 29,6% e 38,5%, respectivamente. Mulheres, negros e outras etnias minoritárias podem apresentar maior prevalência. Estima-se que a obesidade, até 2030, afete 30,2% e o sobrepeso de 37,7% das brasileiras.

Confira as estimativas para outras parcelas da população em 2030:

  • Homens: obesidade, 28,8%, e sobrepeso, de 39,7%;
  • Pessoas brancas: obesidade, de 27,6%, e sobrepeso, de 38,8%;
  • Pessoas negras e outras etnias: 31,1% para obesidade e 38,2% para sobrepeso (dados de pessoas não brancas combinadas)
  • Maior nível de escolaridade: obesidade de 26,2%;
  • Menor nível de escolaridade:  obesidade de 35,4%.

O estudo nacional foi divulgado no final de junho no Congresso Internacional sobre Obesidade (ICO 2024), ocorrido em São Paulo, e é do pesquisador Eduardo Nilson, do Programa de Alimentação, Nutrição e Cultura (Palin) da Fiocruz Brasília, juntamente com equipe. A pesquisa completa ainda não foi publicada.

As tendências às quais o estudo se refere é a uma modelagem que foi adotada utilizando dados da Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), do Ministério da Saúde – um inquérito telefônico nacional anual, que avalia fatores de risco para doenças crônicas não preveníveis, como o sobrepeso e a obesidade. 

Impactos à saúde e econômicos 

Dados estudo A Epidemia de Obesidade e as Doenças Crônicas Não Transmissíveis  (DCNT) – Causas, custos e sobrecarga no SUS, publicados em 2022, revelam que o risco associado de diversas DCNT é o mais preocupante. Isso porque a prevalência pode ter consequências impactantes para o SUS.

Segundo os pesquisadores, o acúmulo de gordura corporal em excesso está associado com aumento no risco de mais de 30 DCNT, seja em maior ou menor grau. A pesquisa foi realizada por uma equipe de 17 pesquisadores de diversas universidades brasileiras e uma do Chile e financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Já no levantamento da Fiocruz Brasília, os autores utilizaram um modelo de tabela de vida para estimar os impactos do sobrepeso e da obesidade sobre 11 doenças associadas ao elevado Índice de Massa Corporal (IMC) no país até 2044. A estimativa foi feita levando sob a suposição de manutenção das tendências atuais. 

O modelo estima casos incidentes e mortes atribuíveis de doenças cardiovasculares, diabetes, cirrose, cânceres e doença renal crônica – com base no Estudo de Carga Global da Doença (GBD) e em dados demográficos e epidemiológicos de pesquisas nacionais.

“De acordo com o cenário de manutenção da tendência atual, a prevalência de sobrepeso e obesidade entre adultos brasileiros aumentará de 57% em 2023 para 75% em 2044. Consequentemente, estima-se que 10,9 milhões de novos casos de doenças crônicas associadas ao sobrepeso e obesidade se desenvolvam nos próximos 20 anos e 1,2 milhão de mortes atribuíveis ao sobrepeso e à obesidade durante esse período”, menciona a Fiocruz Brasília em nota.

A Fiocruz Brasília informa que além dos impactos à saúde, a obesidade também afeta questões econômicas. “Essa epidemia de obesidade já causa e continuará causando uma maior carga epidemiológica e econômica para o Brasil, considerando as comorbidades da obesidade e seus custos relacionados”, diz um trecho da nota.

O pesquisador da Fiocruz Brasília, Eduardo Nilson, reforça o impacto da carga econômica gerada por uma população em sua maioria obesa.

“Pensando que uma população doente, ela produz menos, ela morre precocemente, então aí nós temos os chamados custos indiretos da obesidade e a dimensão dela é muito grande, porque ela representa, por exemplo, atualmente, cerca de 2,1% do PIB. Mas se nada for feito pode chegar a 4,5% do PIB em 2060. Então representa uma carga econômica muito grande para a sociedade como um todo”, ressalta o pesquisador.

O economista e educador financeiro Francisco Rodrigues reforça que, com a prevalência da obesidade na população brasileira, o custo social do país vai aumentar.

“O sistema de saúde é impactado e, consequentemente, o Ministério da Saúde, os gastos e os investimentos para a saúde terão que aumentar, ou seja, um custo cada vez maior e um investimento cada vez maior que aumenta o quê? O custo para o país”, menciona Francisco.

Caminhos para enfrentar a obesidade

Segundo Eduardo Nilson, da Fiocruz Brasília, as mudanças no estilo de vida da população, em relação à dieta e sedentarismo, podem explicar o aumento da obesidade observado no país. Ele destaca que a adoção de alimentação ultraprocessada em detrimento de alimentos naturais colaboram para a obesidade. 

“A gente vê uma redução, por exemplo, do consumo de arroz e feijão, substituindo por alimentos prontos para o consumo, que têm um padrão nutricional muito inadequado. E isso eleva, inclusive, do ponto de vista de energia, eleva a questão da obesidade diretamente”, afirma Eduardo Nilson.

Para ele, a população deve basear as escolhas nutricionais no Guia Alimentar Brasileiro. Além disso, Eduardo ressalta a importância da implementação de políticas que instruam escolhas alimentares mais saudáveis, por exemplo as políticas de rotulagem de alimentos, com indicação visível da presença de alto teor de gorduras, sódio e açúcares. O pesquisador avalia que o momento é oportuno para implementação de ações que visem influenciar a escolhas alimentares saudáveis a partir da regulamentação da reforma tributária.

“Primeiro trazendo os alimentos mais saudáveis, mais baratos, para a população como um todo, e principalmente, a população mais pobre, que é onde a gente vê, principalmente um aumento maior ainda das prevalências de obesidade, e também associando ao maior aumento do consumo de alimentos processados. Então, com base nisso, nós vamos ter uma cesta básica desonerada, uma cesta básica que é o composto de alimentos saudáveis”, afirma Eduardo Nilson.

O economista e educador financeiro Francisco Rodrigues pontua que o governo pode adotar estratégias de propaganda em seus canais oficiais, no rádio e na TV. “Uma ação efetiva por meio do Ministério da Saúde, juntamente com os órgãos regulatórios, com os conselhos de quais lugares e em quais situações”, diz. 

Francisco afirma que as iniciativas devem  estimular adultos, crianças e adolescentes a escolherem melhor os alimentos e adotarem hábitos saudáveis para evitar problemas de saúde e, consequentemente, sobrecarregar o SUS. Para ele, a escola também é um ambiente onde as ações em prol da saúde devem se concentrar.

“A grande mudança necessária para que gere o impacto social cada vez maior está na escola. Quando o professor ensinar uma maneira correta de se alimentar,  quando a escola fizer uma merenda saudável e quando tiver ações efetivas também relacionadas a plantas e, ao mesmo tempo, a produtos que podem ser realmente utilizados de maneira saudável tanto na escola quanto em casa, isso vai gerar um impacto social para as crianças, para os adolescentes e para os adultos”, afirma Francisco. 

Recorte municipal

Dados da Vigitel divulgados em 2023 apontam índices por capitais brasileiras com relação à incidência de obesidade e sobrepeso no país.

A Vigitel Brasil 2023 ainda divide a análise por sexo. Entre os homens, foram observadas maiores frequências de excesso de peso em Porto Alegre (68,8%), Rio de Janeiro (68,4%) e Campo Grande (66,9%). Já entre mulheres, em Manaus (64,5%), Salvador (63,1%), Cuiabá (62,9%).

Considerando as 27 capitais, a frequência de excesso de peso foi de 61,4%, com maior grau entre os homens (63,4%) do que entre as mulheres (59,6%). 

Já em relação à obesidade, a frequência de adultos obesos variou entre 17,7% em Goiânia e 30,4% em Macapá. As maiores frequências seguem entre os homens em Macapá (33,4%), Campo Grande (27,9%) e Porto Alegre (26,8%) e, entre as mulheres, em Fortaleza (29,8%), Cuiabá (29,7%), e Porto Alegre (29,6%). 

Levando em consideração as 27 capitais, a frequência de adultos obesos foi de 24,3%, com semelhança percentual entre mulheres (24,8%) e homens (23,8%). 

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